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Lorenna Barcelos Books

O Impulso, de Ashley Audrain – Instinto materno e a pressão sobre a figura da mãe

o impulso livro ashley audrain

Tema pertinente ou necessário? Terminei a leitura sem conseguir definir, mas acredito que esse assunto precisa ser debatido mais abertamente. Em O Impulso a autora Ashley Audrain escreve um relato bem direto ao ponto e que pode chocar algumas pessoas.

Sinopse:

Blythe Connor está decidida a ser a mãe perfeita, calorosa e acolhedora que nunca teve. Porém, no começo exaustivo da maternidade, ela descobre que sua filha Violet não se comporta como a maioria das crianças. Ou ela estaria imaginando? Seu marido Fox está certo de que é tudo fruto do cansaço e que essa é apenas uma fase difícil.
Conforme seus medos são ignorados, Blythe começa a duvidar da própria sanidade. Mas quando nasce Sam, o segundo filho do casal, a experiência de Blythe é completamente diferente, e até Violet parece se dar bem com o irmãozinho. Bem no momento em que a vida parecia estar finalmente se ajustando, um grave acidente faz tudo sair dos trilhos, e Blythe é obrigada a confrontar a verdade.
Neste eletrizante romance de estreia, Ashley Audrain escreve com maestria sobre o que os laços de família escondem e os dilemas invisíveis da maternidade, nos convidando a refletir: até onde precisamos ir para questionar aquilo em que acreditamos?

Pessoalmente eu não posso dizer nada quanto ao encantado amor de mãe, ou instinto materno. Eu fui amada da forma como dizem ser certo para as mães. E não conheci outro amor, senão esse que vemos nas novelas, nos livros, em comerciais.
 
Mas eu sempre ENXERGUEI que essa realidade não se aplica a todas as mulheres. E mesmo quando eu via que isso não se encaixava a todas, o julgamento estava sempre presente ao presenciar alguma situação entre mães e filhos aonde eu pensava “isso não é mãe”. Pesado, né? Mas isso é o que o mundo impõe quando ouvimos desde sempre todas as coisas que colocam mães como seres místicos. De fato, são mesmo. Eu acredito piamente no instinto materno e que mães são criaturas ímpares. Tudo isso que dizem para a gente. Desde que essa mãe QUEIRA assumir esse fardo.
 
Sim, ser mãe é um fardo e isso a gente não ouve falar por aí…
Quando eu passei a questionar sobre “será que elas de fato queriam isso para a vida delas ou apenas aceitaram”? Aí “o buraco ficou mais embaixo”.
Eu, pessoalmente, queria muito ser mãe de 3 filhos quando era adolescente. E hoje, aos 28 anos eu não sei se quero ser mãe nem de um. Essa é a verdade. Simplesmente parei para refletir que não quero passar a vida preocupada, não quero me doar 100% para outra pessoa e colocar minhas expectativas em um ser que nem nasceu ainda. Nem ditar as regras para alguém que vai ter um cérebro e vontades próprias. Esse é meu sentimento atual.
“Ah, mas quando a gente vê a carinha deles, o amor que eles nos dão, tudo compensa”. Será que compensa, mesmo?
 
E aqui não estou julgando, só perguntando como forma de questionamento. Por que essa é a frase feita, a de que no fim tudo compensa, e eu sinceramente não vejo nada como verdade absoluta nessa vida. E acredito que seja aceitável alguém vir com o contrário dessa máxima. 
 

Por isso esse livro é tão importante.

Eu nunca li nada tão direto a respeito da maternidade quanto em O Impulso. Muito além de termos uma criança que claramente tem impulsos psicopatas, aqui temos a história da mãe que não queria ser mãe e tem o instinto de entender que algo está errado.
 
Ela não queria ser mãe, mas tinha todas essas coisas como instinto e percepção. Aí é que está, será que é instinto materno ou instinto humano? Tudo o que Blythe, nossa personagem, sabe com certeza é que tem algo de errado com a filha dela e que ela não deseja aquela criança. O vínculo que supostamente deveria ser natural não aconteceu.
 
A história também faz o leitor sentir o peso de como a maternidade – mesmo a compulsória – é solitária, às vezes. Ninguém se dispos a ficar do lado da Blythe ou ao menos tentar entender a situação (mesmo que as vezes não estivesse tão clara). Justamente pela máxima: uma mãe deve amar seus filhos, a maternidade é linda, tudo compensa, uma mãe tem que resolver todos os problemas.
 
E não é contraditório que justo uma mãe não entenda outra quando ela está com problema com sua filha? Os sentimentos maternos não são, supostamente, únicos a todas? Isso é o que dizem… Mas algumas mulheres estão tão focadas em tomar para si todos os atributos que ser mãe carrega, que elas são incapazes de olhar para outra mãe da mesma forma que ela se pinta. O julgamento está sempre presente, quase como uma competição. E isso foi imposto. 
 
O machismo também é bem pontuado na narrativa. E aqui eu nem quero entrar muito a fundo na questão, pelo fato de ser uma discussão muito abrangente. Mas essa personagem sofre muito com o próprio marido, quando ele não é capaz de enxergar o que tem de errado com a filha e olhar para a esposa como mulher e não como mãe.
 

** SPOILER **

E chegamos ao ponto em que eu achei muito contraditório, A Blythe não quer ser mãe de jeito nenhum, mas a partir do ponto que ela engravida de Sam parece que essa coisa de maternidade brota nela. E aqui fica bem difícil não julgar, mas acho que a chave da história é justamente essa: ela nunca quis ser mãe, por uma série de questões, mas ela pode mudar de ideia se ela assim QUISER, e não por vontade do marido, da sogra…
 
Eu acho que o que aconteceu com a Blythe foi que quando a mãe dela a abandonou na adolescência, ela a salvou mesmo sem saber. E esse resquício de querer tentar ser o que a mãe não foi aconteceu com o Sam e não com a Violet.
Mas com a Violet a maternidade foi empurrada nela, ela não queria. 
E quando ela engravidou do Sam como uma maneira de “consertar” as coisas é que eu fiquei achando meio esquisito.
 
Sim, a Violet dá arrepios para nós leitores que estã de fora, mas será que se estivéssemos dentro da situação compreenderíamos a Blythe com facilidade? Tipo, é uma criança, aparentemente linda e normal, será que também não pensaríamos “que mulher doida, não tem nada errado com essa criança fofa”.
 

** FIM DO SPOILER **

As vezes é preciso ouvir as pessoas um pouco mais…
 
Por fim, eu adorei a escrita da autora e a linearidade do livro, mesmo tendo alguns flashs o passado da personagem. E creio que o grande ponto foi deixar o leitor pensativo quando ao fato de: será que tudo o que aconteceu reflete mesmo no presente? Ou será que é possível seguir um outro caminho?
 
Gostei do final, onde fica implícito que o inevitável aconteceu, e até gostaria de uma continuação. 
 
Eu me apeguei a essa personagem e amei a leitura. Recomendo a quem for ler que abaixe a guarda antes de julgar qualquer atitude da Blythe e se questione sempre o contrário.
 

Ficha técnica

Título: O Impulso, traduzido por Lígia Azevedo
Título original: The Push
Autora: Ashley Audrain
Editora: Paralela
Número de páginas: 328
Ano de publicação: 2021
Gênero: Suspense psicológico, mistério, thriller

Assista ao vídeo:

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